segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

VOTO LGBT

Mix entrevista José Itaparandi, eleito verador em Paço do Lumiar
Foto: Reprodução


Contado com a ajuda de todos os orixás, o babalorixá José Itaparandi conseguiu ser o terceiro candidato mais votado em Paço do Lumiar, no Maranhão.

Ex-Coordenador de Cultura do município que fica no extremo norte do estado e tem cerca de 100 mil habitantes, o assumidíssimo Itaparandi precisou remar contra a forte maré da mercantilização de votos, decorrente da cara-de-pau de quem compra e da situação precária de quem vende.

Numa conversa super descontraída com o Mix, Itaparandi fala das dificuldades enfrentadas por ser gay numa região conservadora, da sensação de ver seu trabalho reconhecido mesmo tendo feito uma campanha com poucos recursos e de planos para o futuro.


Você foi o terceiro mais votado para vereador na cidade. Esperava esse resultado?
Não sei dizer se esperava. Mas por outro lado, já tenho 26 anos de intenso trabalho social. Estive sempre perto da área cultural, incentivando e colaborando com as expressões artísticas de nossa região. Também sempre trabalhei ao lado da comunidade LGBT e seu reconhecido por isso. Acreditei que tinha respaldo para ser eleito.


Como foi a hora da divulgação do resultado?
Eu fiquei na porta de casa, ouvindo a apuração pelo rádio. Logo toda a comunidade estava na rua, fazendo a maior festa. Todo mundo estava muito eufórico, mas eu preferí não comemorar. Eu tive pouquíssimo apoio durante a campanha, foi tudo muito difícil. Além disso, vejo o mandato de vereador como mais uma responsabilidade pra minha cabeça. Vai ser muito trabalhoso. Mas chegou uma hora que eu resolvi dar uma volta pela comunidade, acompanhado por meus eleitores.


Você é babalorixá. Acredita que as divindades ajudaram a ser eleito?
Claro que ajudaram! Eu acredito muito numa frase bíblica que diz: "Tudo posso naquele que me fortalece" e os orixás estão sempre comigo. Acredito até que muitos deles foram até às urnas e votaram em mim. Muita gente veio me dizer que orixá não vota, mas vota sim! Só com a ajuda deles eu poderia ter vencido tanta corrupção, tanto abuso financeiro. Ví muita gente de voto vendido, inclusive gays fazendo campanha para candidato homofóbico. Um deles, vestindo a camiseta de um adversário, me viu na rua e disse que me amava. Eu respondí: "tu me amas, mas odeias a ti mesmo". Como pode ser gay e negro e trabalhar para um candidato que oprime as minorias? Também senti muito preconceito vindo de outros candidatos, fui muito agredido. Cansei de ouvir que minha candidatura era uma falta de vergonha, que caso eu fosse eleito, a cidade ficaria cheia de qualiras (gíria para gays). Eu posso até ter sido o terceiro mais votado, mas se for levar em consideração só a vontade do povo, eu fui o primeiro.


Em que você baseou sua campanha?
Eu não defendi projeto algum além de trabalhar para o povo. Só sentando com toda a comunidade, será possível identificar dificuldades, descobrir necessidades e encontrar soluções. Nossa região tem muitas demandas, mas é preciso definir prioridades. O importante é não perder a ligação com o povo, com quem mais precisa.


Você foi Coordenador de Cultura de Paço do Lumiar. Há algum projeto iniciado que você pretende continuar como vereador?
Sim, a itinerância dos eventos promovidos pelo município. Como Paço do Lumiar engloba distritos situados em ilhas, a distância que os separa é muito grande e tudo ficava muito centralizado, dificultando para quem mora longe da sede do município. Conseguimos levar nosso Carnaval e Festas Juninas para vários distritos, deixando a cultura próxima de mais pessoas. Fizemos muito, mas muito ficou a ser feito. Privilegiamos a cultura popular, o que é ótimo, mas queremos também ampliar o acesso à literatura, à arte erudita. Planejamos ainda promover a educação regionalizada, respeitando costumes de nosso povo. O Plano de Cultura do Município ainda está só no papel, precisamos viabilizá-lo. Além disso, queremos fazer a diplomação dos mestres da cultura popular de nossa região. Será uma forma de incentivá-los e garantir o respeito da população.


O que LGBTs de Paço do Lumiar podem esperar de seu mandato?
Asseguro que darei tudo de mim. Quero que os gays daqui entendam que é preciso nos unirmos, termos consciência de classe. Só assim vamos conquistar nossos direitos. E quero trabalhar muito a educação junto aos gays. Precisamos incentivá-los a concluir os estudos e buscar fazer uma faculdade, buscar um futuro melhor, mais digno. A questão da educação sexual também precisa ser vista com cuidado, com campanhas para prevenção ao HIV e outras DSTs. O número de soropositivos vem aumentando muito por aqui. Ontem mesmo, perdi um amigo que tinha o vírus.

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