segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

4 por 4 com os vereadores LGBT Eleitos em 2008, eles foram escolhidos para representarem a comunidade em quatro cidades do Brasil


Por Gustavo Ranieri
Gonline Turismólogo, dançarina de axé, cabeleireira, advogado. Estas são as profissões de José Itaparandi, Leo Kret do Brasil (vulgo A Cretina), Moa e Sander Simaglio, os únicos quatro assumidos LGBT (entre os 88 listados pela Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros) que se elegeram a vereadores. Eles representarão a comunidade nos próximos quatro anos nas Câmaras Municipais, respectivamente, de Paço do Lumiar (Maranhão), Salvador (Bahia), Nova Venécia (Espírito Santo) e Alfenas (Minas Gerais).Com propostas específicas para a comunidade de gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros, ou com projetos mais amplos, em que os gays formam apenas uma das parcelas favorecidas, os vereadores revelam uma particularidade em comum: combater a homofobia. Nessa entrevista eles falam sobre homofobia, histórias pessoais e apresentam algumas das propostas pelas quais lutarão a partir de 1º de janeiro de 2009.

José Itaparandi (PTB)
855 votos - Paço do Lumiar (MA)

Quais são suas propostas para a comunidade?

Olhe, nosso Estado fica localizado no Nordeste, e um fato muito preocupante com o povo LGBT é a falta de educação. Digo educação me referindo às pessoas se graduarem, me referindo ao posicionamento na sociedade, educação no aspecto da saúde, na questão de direito. Então, uma das minhas propostas é despertar os direitos da comunidade LGBT através da educação. Outro projeto é estipular um calendário anual com seminários e outras atividades LGBT.

E como se movimenta a homofobia em Paço do Lumiar?

Muito forte, por isso, um dos projetos é falar da importância do homossexual na sociedade, enquanto fomentador das atividade culturais, elemento sensível, e de importância econômica. Com esses projetos, eu acredito que nós vamos conseguir entrar nas escolas. Mas tão forte quanto a homofobia é a falta de informação a respeito das DSTs. Quero massificar a campanha de prevenção às DSTs/aids.

Você se mostra realmente preocupado, não?

Muito, porque eu vivo momentos muito fortes de preconceito na cidade. Eu já fui criticado por levantar a bandeira gay e por levantar a bandeira da cultura afro, pois sou babalorixá. Ouvi muitos deboches durante a campanha. Por isso chega a ser desesperadora a minha preocupação com as questões que envolvem atualmente os LGBT da minha cidade. Mas, sem dúvida, a minha eleição já foi um avanço grande.



Leo Kret do Brasil (PR)
12861 votos - Salvador (Bahia)

De onde surgiu essa sua popularidade?


Eu tenho o meu trabalho com banda artística, e as pessoas se identificam comigo porque eu sou do gueto e isso contribuiu com a popularidade. Eu sou a cara do povo, eu me vejo no povo e eles se vêem em mim.

É a primeira vez que você se candidatou? Esperava esse resultado?

É a primeira vez, sim. Eu não tenho formação política e nem experiência política, mas estou aqui para lutar. Agora, o resultado eu esperava sim, porque por onde eu passava o povo gritava por mim, me apoiava.

Você recebeu algumas críticas do Luiz Mott, fundador do GGB. Como recebeu isso?

O povo já respondeu por mim. A partir do momento em que meus eleitores, incluindo os LGBT, votaram em mim, eles já responderam. E quem tem que se explicar sobre quem de fato representa é ele, porque ele se diz representante da comunidade junto com o seu parceiro Marcelo Cerqueira, que, no entanto, não ganhou.

Quais são suas propostas para a comunidade?

A primeira se refere a uma lei que combate o preconceito ao homossexual e que ainda não foi regulamentada. Então eu lutarei para regulamentar essa lei e para termos um instrumento de combate à homofobia. E também vou ajudar, nessa questão de discriminação, os bairros mais carentes, fazendo um trabalho de controle social, de muita mobilização. Não me considero a rainha do movimento, mas quero representar, como ninguém, a comunidade LGBT, porque sofro na pele o preconceito e já o venci quando eu fui eleita.

E a carreira, vai continuar?

É claro que a carreira vai continuar. Se o Gilberto Gil podia, por que eu não posso? Vou continuar dançando na banda Saiddy Bamba, que foi a banda que me lançou. E foi com ela que surgiu o fenômeno da quebradeira Léo Kret.



Moa (PR)
871 votos - Nova Venécia (ES)

O que representa sua reeleição para o combate à homofobia?


Veja, eu sou presidente da Câmara desde janeiro de 2007 e venho trabalhando muito. Mas a minha reeleição serve, de alguma maneira, para quebrar um pouco a homofobia, porque homofobia não é o crime de uma pessoa sacar uma arma e matar. A homofobia é uma discriminação que acontece diariamente. Além disso, eu mostro que a Moa está aí para conviver com todo mundo, porque quem trabalha aqui não é uma transexual, mas um ser humano. De que adianta uma lei aqui em Nova Venécia para criminalizar a homofobia se a nossa justiça não está preparada para isso, se a nossa educação não está preparada? Nós temos que nos impor. Meu orgulho é ter sido reeleita depois de um trabalho árduo, desgastante. A Moa implantou o respeito ao dinheiro público, à moralização, combateu a corrupção, a Moa esteve presente de salto alto na Câmara, na vida política de Nova Venécia e conseguiu crescer politicamente.

Mas existe algum projeto seu em prol dos LGBT?

O que nós lutamos mesmo é para acabar com a homofobia, mas isso não é do dia para noite não, o que vai mandar mesmo é Brasília. Precisamos mostrar que estamos presentes e não podemos nos calar diante de certas coisas.

Por que um número tão baixo de candidatos LGBT foram eleitos na sua opinião?

Porque eu acredito que o movimento LGBT encontra muitas dificuldades quando se separa. E em todas as casas têm gays e eles não têm coragem de se assumir, porque depois que se levanta a bandeira, para se reeleger complica muito. Aqui no meu Estado, muitos LGBT foram motivados a disputar e tiveram uma votação muito baixa.



Sander Simaglio (PV)
629 votos - Alfenas (MG)

Qual é a responsabilidade de ser um LGBT na Câmara?


A maioria dos votos que tive não foi de LGBT. Posso afirmar que esses não foram mais de 10% da minha votação. O povo da cidade votou em mim, confiando em mim. Elegeram um gay assumido e isso pesa muito para o movimento homossexual organizado. A minha responsabilidade é muito grande e eu estou pronto. Alfenas elegeu um gay assumido, de discurso politizado, militante do movimento gay organizado, advogado, criativo, audacioso em realizar em uma cidade do porte de Alfenas a Parada do Orgulho LGBT em suas cinco edições.

Existem projetos seus em prol dos LGBT ou não?

Claro, mas Alfenas é modelo de tolerância para o Brasil. Nesses cinco anos que presidi a única ONG gay da cidade, conseguimos aprovar por unanimidade na Câmara Municipal da Cidade a Lei que pune discriminação a homossexuais, uma das primeiras do Estado, e a lei que institui o Dia Municipal de Visibilidade Lésbica. Anualmente acontece na cidade a já tradicional Semana Sul Mineira da Diversidade Sexual, que culmina com a Parada. Quer dizer, foi feito muito para os LGBT. Criamos e mantemos o centro sul mineiro de referência homossexual, em parceria com o governo federal, a academia de musculação MGA Fitness, projeto em parceria com o governo estadual que trata e previne a lipodistrofia em portadores de aids. Acho que é isso, mas sou um gay assumido na Câmara - coisa rara no Brasil - e em todos os assuntos que iremos tratar terei a veia de militante gay pulsando em mim, não deixando de lado a sensibilidade gay em tudo.

Existe uma explicação para tão poucos candidatos LGBT terem se elegido?

Porque gay não vota em gay. Repare que nenhum gay foi eleito com votos de gays militantes, assumidos. Se fosse assim, elegeríamos os cinco candidatos em São Paulo de uma só vez. Quantos gays votam em São Paulo? Milhares, mas realmente prevalece a premissa que gay não vota em gay. O caso da travesti em Salvador foi uma exceção. Não a conheço do movimento de luta, nunca a vi num encontro de ativistas. Não sei se tem discurso político, creio que não. Foi eleita como um gay caricato, aquele que a TV adora mostrar para nos estereotipar. Essas figuras não me representam. Quem nos elegeu foi o povo hétero, reconhecendo o trabalho de cada um desses militantes gays em sua cidade. Se fôssemos unidos nas urnas, elegeríamos não só vereadores, mas prefeitos, governadores... triste, mas é a realidade.

O que falta para alcançarmos nossos plenos direitos?

União, consciência. Precisamos sair nas ruas "dando pinta" como lá dentro das boates, nos guetos, aí seremos reconhecidos, teremos visibilidade. Quando digo "dar pinta", é assumir, ser a gente mesmo, exigir nossos direitos, nos organizarmos, institucionalizarmos onde ainda não existem ONGs, sermos fortes e unidos. Aí mudaremos a realidade em que vivemos numa outra mais democrática.


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